Na última quinta-feira, dia oito, o brasileiro Filipe Toledo rendeu ao Brasil mais um título mundial, configurando o sexto título do país verde-amarelo em oito anos. Após duas baterias muito bem disputadas entre ele e o atual campeão olímpico Ítalo Ferreira, também brasileiro, foi Toledo quem conseguiu as melhores notas e levantou o troféu da WSL Finals.
FILIPE TOLEDO É CAMPEÃO MUNDIAL DE 2022! 7️⃣7️⃣????
O sonho se tornou realidade: Filipe Toledo vence Italo Ferreira por 2 a 0 no Confronto do Título no #RipCurlWSLFinals e se torna CAMPEÃO DO MUNDO pela 1ª vez na carreira.
Uma temporada ÉPICA para o local de Ubatuba. #WSLBrasil pic.twitter.com/Gx4L0F5MZd
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Esse é o sexto ano de oito em que o Brasil termina como o grande vencedor da temporada, sendo o quarto ano consecutivo que um surfista da brazilian storm levanta a taça, com exceção do ano de 2020, quando a temporada foi cancelada devido à pandemia da Covid-19.
Ainda sim, a dominância verde-amarela nos rankings da WSL e nas finais é algo relativamente novo. O primeiro título quem trouxe para casa foi Gabriel Medina, em 2014. Antes, a tabela dos campeões mundiais era preenchida apenas por gringos.
Um pouco de história…
A grande novidade para o próximo ano: ASP mudará o seu nome para WSL – World Surf League. Foto Cestari pic.twitter.com/XpU81poY6J
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Antes do tour mundial de surfe tomar o formato como conhecemos hoje, o campeonato passou por diversas mudanças. Os surfistas havaianos Fred Hemmings e Randy Rarick criaram a International Professional Surfers (IPS – Surfistas Profissionais Internacional), que compilava diversos campeonatos antes não relacionados e desenvolveram uma tabela de sistema de classificações e julgamento padronizada, encorajando surfistas profissionais a se envolverem. A organização se manteve sob esse nome de 1976 a 1982.
Já em 83, a IPS muda um pouco, pelas mãos do vice campeão Ian ‘Kanga‘. Agora se chamando Association of Surfing Professionals (ASP – Associação de Profissionais de Surfe), um conceito novo foi desenvolvido, o de “Tour dos Sonhos“, não só colocando em mesmo pé de autoridade os surfistas e os organizadores de eventos como também promovendo a ideia de levar as competições para lugares com picos melhores ao invés de permanecer em áreas populosas.
Foi apenas em 2015 que a Liga Mundial de Surfe (WSL) realmente tomou corpo como conhecemos hoje, sob o nome novo e com uma organização mais centrada e incorporada. E mais recentemente ainda, a partir de 2021, que a WSL Finals foi inaugurada.
Havaí: um dos berços do surfe

O estado havaiano é amplamente conhecido por sua bandeira nas competições profissionais de surfe: a qualidade e importância que ele retém em relação ao surfe o concede uma bandeira a parte do país o qual integra, os Estados Unidos.
Durante a duração do Circuito Mundial do IPS, o Havaí foi representado apenas no circuito feminino, mas das seis vezes que as mulheres competiram no mundial, a taça foi ganhada por havaianas cinco vezes, sendo apenas duas as atletas que subiram no pódio ao longo desse tempo: Margo Oberg e Lynn Boyer.
Foi apenas em 93, dez anos após a modificação do IPS para a ASP que um surfista havaiano conquistou o título mundial. O nome é Derek Ho, o surfista que faturou o título de Pipe Master duas vezes. Ainda sim, foi apenas sete anos depois que o Havaí voltou a ser representado na tabela dos campeões do título. Sunny Garcia subiu em 2000 e de 2002 a 2004, foi o lendário Andy Irons, um dos maiores rivais do atual onze vezes campeão Kelly Slater (EUA), que trouxe mais três títulos para o país havaiano.
Mas no feminino, as coisas não foram tão “rápidas”. De 1982 até 2011, nenhuma outra surfista feminina conseguiu ultrapassar as muitas estadunidenses e australianas que eram comuns no pódio, mas foi Carissa Moore que quebrou essa alternância e alcançou o sexto título mundial do Havaí no feminino, e seu primeiro de muitos.
Em 2013, Moore fez isso de novo e, para inaugurar a WSL, ela conquistou o título em 2015, e mais uma vez em 2019 e 2021.
CARISSA MOORE Campeã do Mundo de 2021 no #RipCurlWSLFinals @rissmoore10 venceu a 3ª bateria da final em cima da nossa representante brasileira @tatiwest e se torna a mais nova PENTACAMPEÃ DO MUNDO no #RipCurlWSLFinals!#WSLFinals #WSLBrasil pic.twitter.com/ZFUJeF62TD
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Depois de Irons, foi apenas em 2016 que um atleta masculino venceu o campeonato, e não apenas esse ano, mas no seguinte também. John John Florence, surfista que esteve de fora do WCT de 2022 devido à lesões, se tornou bicampeão nesses dois anos, trazendo pra casa a taça do mundial.
Na última WSL Finals, nenhum havaiano competiu no masculino, mas no feminino Carissa Moore acabou perdendo para a australiana Stephanie Gilmore (AUS), já nas últimas baterias da final.
Austrália: casa do canguru e de mais de quarenta títulos mundiais
8x STEPHANIE GILMORE! ??? A australiana vence todas as baterias no #RipCurlWSLFinals e é Campeã Mundial pela oitava vez na sua carreira.#WSLBrasil pic.twitter.com/THqCBjs3tz
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É inegável que está no DNA de todo australiano o potencial para ser um surfista profissional, e o número de títulos que já foram conquistados por atletas que representam a bandeira dos aussies é exemplo disso.
Desde a criação da IPS, foram quarenta e um títulos, somando o masculino e o feminino. O número sobe para quarenta e seis, se for levado em conta a ISF World Surfing Championships e a Smirnoff World Pro-Am Surfing Championships.
Midget Farrelly, Nat Young e Phyllis O’Donnel foram três dos primeiros atletas a vencerem e se tornarem os melhores do mundo. Mas se contarmos apenas da IPS para a frente, Peter Townend, Wayne Bartholomew e Mark Richards foram os surfistas que dominaram a competição nos sete anos de duração da IPS, perdendo o pódio apenas uma vez, em 77, para Shaun Tomson, da África do Sul.
Com a mudança para APS, Tom Caroll abriu as competições, ganhando o título nas temporadas de 83/84 e 84/85. Após um ano de lacuna vaga australiana, Damien Hardman conquistou o pódio, seguido por Barton Lynch, em 88. Hardman levantou a taça em 91, e em 99 foi a vez de Mark Occhilupo. Até 2007, nenhum outro australiano ganhou o WCT, mas Mick Fanning veio para mudar isso.

Campeão em 2007, 2009 e 2013, Fanning foi o último australiano a ser campeão mundial no masculino, e Joel Parkinson foi o penúltimo, em 2012.
No feminino, foi apenas em 89, com Wendy Botha, que a Austrália se tornou campeã mundial, após Phyllis O’Donnel, e foi em sequência que o feito se repetiu. Se 89 deu Botha, 90 foi o ano de Pam Burridge, mas 91 e 92 deu Botha de novo. Pauline Menczer veio em 93, mesmo ano da vitória de Derek Ho (HAV).
De 98 a 2003, a australiana Layne Beachley foi a verdadeira “dona do pedaço”. A surfista foi a campeã ininterrupta por seis anos, voltando pela última vez em 2006. Mesmo assim, 2005 foi Chelsea Georgeson quem representou a Austrália, e de 2007 a 2010, o nome liderando as tabelas do feminino foi a da atual campeã, Stephanie Gilmore, que também ganhou em 2014, 2018 e agora, em 2022.
EUA: bandeira do GOAT

Desde o surgimento da IPS, os Estados Unidos não estavam tão representados quanto são hoje na WSL. Durante os sete anos de duração do circuito mundial nesse formato, os EUA só apareceram como campeões uma única vez, na categoria feminina, por Debbie Beacham em 1982.
Esse feito da surfista funcionou como um pé de coelho para os anos iniciais da ASP. Os próximos quatro anos contaram com vencedoras dos EUA: Kim Mearing (83/84) e Freida Zamba (84/85, 85/86 e 86/87). Com um ano interrompido, Zamba voltou ao pódio em 88.
No masculino, Tom Curren foi o nome da fase inicial do tour da ASP. Ele faturou o título em 85/86, 86/87 e em 90 e, em 92, outro nome que faria história surgiu: Kelly Slater. O surfista que compete até hoje no WCT é o maior campeão mundial, tanto no masculino quanto no feminino, com onze títulos para a conta. 1992 foi seu primeiro ano, e os próximos cinco foram ininterruptos, de 94 a 98. Durante essa mesma época, Lisa Andersen conquistou seus quatro títulos, de 94 a 97, fazendo com que os campeões desses anos fossem dobradinha: Slater e Andersen, os dois representando a bandeira das cinquenta estrelas.
Em 2001, CJ Hobgood ganhou o título para casa, mas Slater não deixou ninguém mais subir ao pódio depois disso. Todos os próximos anos que os EUA saiu como campeão mundial de surfe, em 2005, 2006, 2008, 2010 e 2011, foi Slater que teve o rosto estampado em revistas, noticiários e publicações sobre a última etapa e o grande campeão.
Brasil: país do futebol e também do surfe
Um clube desse! ????#WSLBrasil pic.twitter.com/vT9qRr9ZTJ
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O Havaí, a Austrália e os EUA por muito tempo pareciam algo como a política do café com leite: sempre se alternando no topo, mas isso não era devido à nenhum esquema por detrás das câmeras; a tradição de surfe e a condição do país proporcionava uma possibilidade de que atletas surfistas surgissem e pudesse treinar para se tornarem profissionais.
No Brasil, isso demorou um pouco a chegar, mas chegou. Primeiro, brasileiros começaram a entrar no WQS, a divisão de entrada do circuito mundial, e depois alcançaram o WCT. Adriano de Souza, mais conhecido como o mineirinho, foi o primeiro a competir pela bandeira brasileira no WCT, em 2005.
Adriano de Souza, o Mineirinho, é campeão mundial de surfe. https://t.co/BFtE9uuLUo pic.twitter.com/LWZBomh5Hn
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Isso abriu portas: brasileiros podiam sim surfar com nomes como Slater, Fanning e Irons. E a partir daí, o país foi evoluindo no esporte e de pouco a pouco reivindicando seu lugar no circuito. Até que, em 2014, Gabriel Medina solidificou de vez o pertencimento da brazilian storm onde ela deve estar: no WCT, no topo, no pódio.
Medina ainda jovem, com seus vinte anos, revolucionou todo o cenário do surfe brasileiro e mundial e não foi para menos. No ano seguinte, o mineirinho foi quem tomou a taça, depois de muitos anos desenvolvendo a qualidade de surfe que tem hoje. Os anos de 2016 e 2017 pertenceram à JJ Florence (HAV), mas desde 2018, o Brasil segue invicto.
Medina em 2018, Italo Ferreira em 2019, Medina em 2021, Filipe Toledo em 2022. Desde a instalação da WSL Finals, a final foi brasileira.
No ano passado, a disputa ficou entre Filipe Toledo e Gabriel Medina, após uma semifinal entre Toledo e Italo. Já em 2022, a bateria entre o segundo colocado e o que venceu o confronto entre o terceiro foi entre Brasil e Austrália, mas Ferreira passou e a final foi da casa verde amarela. Foi Brasil.
É CAMPEÃO! É CAMPEÃO! É CAMPEÃO! ???????#WSLBrasil pic.twitter.com/vCVSEOCS6B
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Além disso…
Alguns outros países já ganharam os títulos mundiais. Antes da IPS, quando uma etapa foi realizada em Punta Rocas, no Peru, foi o peruano Felipe Pomar, em 1965, que ganhou.
Na segunda edição da IPS, foi o sul-africano Shaun Tomson que faturou o título, e no feminino, o primeiro título que Wendy Botha ganhou foi representando a África do Sul.
Em 2004, o Peru ressurgiu de novo, com Sofia Mulanovich. Desde então, nenhum outro país ganhou o campeonato mundial, mas muitos são representados no circuito. Vale menção honrosa à Brisa Henessy, que foi a quarta colocada nas finais da WSL de 2022, representando Costa Rica.
Foto em destaque: reprodução WSL.